A TÁBUA DE ESMERALDA
Verdade. O tempo passou, a alquimia foi feita, Jorge avisou, Gil atestou e o clássico "A Tábua de Esmeralda" faz cinquenta anos esse mês. Jorge lançava em maio de 1974 um dos maiores pilares da MPB. Quase a sua obra prima. Eu digo "quase" porque é sempre difícil apontar ou assegurar entre a obra de um artista (sobretudo, extensa) qual registro é o mais importante. Porém, eu posso garantir que esse é um dos mais relevantes, não só da carreira do cantor como da música brasileira em sua plenitude.
Vamos recapitular boa parte dessa odisseia. Vem comigo...
Primeiro: você precisa saber que a história toda remonta o mito de Hermes Trismegisto (três vezes grandíssimo). Nessa história com um pé no Egito são escritos uma série de livros (não necessariamente por uma só pessoa) e são reunidos saberes e crenças egípcias. Aprofundando um pouco mais teremos a botânica, astrologia, matemática, astronomia, geologia, etc... Atribui-se a Hermes a autoria do "Livro dos Mortos" e a "Tábua de Esmeralda" - famoso texto com a introdução e estudo da alquimia. A magia dos metais.
Alquimia foi o pontapé para essa história toda e, também para a criação de Jorge Ben Jor. Reza a lenda que ele e Gilberto Gil estavam na França em 1973 num festival de cinema. Após muitas festividades e arte sendo respirada pela trupe, Jorge chamou Gil para explorar um local que, segundo os locais, eram aonde os alquimistas se reuniam. E, nos fundos dessa estava o Aubergue (sic) Nicolas Flamel - um restaurante com uma porta somente que ficava escondido numa pequena vila. Naquela noite os dois músicos foram explorar mais ainda o lugar. Nicolas Flamel havia sido um dos donos e alquimista de mão cheia.
Muitos anos depois Jorge e Gil disseram que tiveram uma visão misteriosa enquanto estiveram lá. Afirmaram que viram a pessoa de Flamel vagando ali. De qualquer modo, Ben Jor saiu de lá decidido a mergulhar no tema e meses depois (maio de 1974) lançava o disco cultuado com o nome de "A Tábua de Esmeralda".
Para quem ouve pela primeira vez há um estranhamento inicial pelas letras, vozes incidentais e frases soltas, mas depois que o ouvinte entra no clima passa a perceber que trata-se de um tratado filosófico em forma musical. Ou como o próprio criador disse: alquimia musical! São doze faixas divididas na matéria descrita no compêndio esmeraldino. E, também nos estudos que Jorge mergulhou na década de 70. Interessou-se por misticismo, São Tomás de Aquino (um alquimista renomado) e pelos estudos sagrados. Ali ele compôs todas as faixas com as referências acerca das histórias. A começar por "O Namorado da Viúva". Nicolas Flamel envolveu-se com Perenelle, uma mulher que já havia enviuvado duas vezes e, que corria o risco de sucumbir o alquimista nessa também. Ou "Vou Torcer" onde ele invoca São Tomás de Aquino. Ou até mesmo "Os Alquimistas Estão Chegando Os Alquimistas" - o cantor vai ensinado didaticamente o caminho da transmutação. Passando da trituração à coagulação. Processos químicos da Idade Média.
Já em "O Homem da Gravata Florida", o músico descreve a história de Philippus Von Hohenheim mesclando medicina mais moderna e alquimia específica (iatroquímica). Bem como em "Hermes Trismegisto E Sua Celeste Tábua de Esmeralda" onde musicaliza o texto perdido em antigos tempos. Conjectura-se tratar-se de uma tradução direto do árabe feito em ponta de esmeralda de idas eras.
Jorge nos brinda com um disco repleto de magia e exímia música. Mais que isso: acrescenta algo nunca antes visto no país: misticismo e alquimia dentro da musicalidade brasileira. Ele confidenciou-nos que aprendeu latim nessa época. O resultado é estupendo e definitivo. Esse mês (maio) essa obra completa cinquenta anos. E, tudo isso amadureceu de forma tão bela e misteriosa que acredito que para os próximos cinquenta mais bonito e surpreendente ele estará. Quem sabe com novas possibilidades?
CLIC.